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Global Fact: Autoridades debatem desinformação e liberdade de expressão em conferência internacional

Evento discutiu impactos das fake news sobre a democracia e reúne especialistas na FGV Comunicação

O Centro Cultural FGV recebeu, de 25 a 27 de junho, a 12ª edição da principal conferência internacional sobre checagem de fatos, o Global Fact, sediado na Escola de Comunicação da Fundação Getulio Vargas (FGV Comunicação) e organizado pela International Fact-Checking Network (IFCN), do Instituto Poynter. Pela primeira vez no Brasil, o Global Fact conta com o apoio de importantes iniciativas jornalísticas do país: Aos Fatos, Estadão Verifica, Lupa e UOL Confere.  

Para debater sobre o combate à desinformação e o fortalecimento da democracia, o primeiro painel reuniu os ministros Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e membro do STF, e Jorge Messias, Advogado-Geral da União (AGU).  

O evento reuniu jornalistas, checadores de fatos e intelectuais da área da comunicação do mundo, tendo como objetivo compartilhar experiências e ferramentas que contribuam para melhorar a qualidade do debate público e promover processos colaborativos para aumentar o impacto da verificação de fatos e o combate à desinformação.  

A abertura foi conduzida por Angie Holan, diretora da IFCN, e por Carlos Ivan Simonsen Leal, presidente da FGV. Em seguida, Jean Lima, presidente da EBC, relatou sobre o atual contexto das big techs: 

“Esse processo de desestruturação das democracias têm uma concepção por trás que é de romper pactos sociais. É um método político que usa da desinformação como metodologia política para desestabilizar as democracias”, disse.  

 

Desafios na autonomia digital contemporânea  

A ministra Cármen Lúcia discorreu que a sociedade ainda não tem autonomia digital assegurada. Atualmente, há um grande desafio pairando sob os indivíduos: a qualidade e quantidade exponencial de dados que tem minado o ser humano por dentro. Munindo-se de metáfora, ela explica que antigamente houve a escravização e dominação de povos, mas que, atualmente, o mundo tem outro comportamento mediante as plataformas.  

“Oferecem dados que são falsos e, portanto, não precisam aprisionar por algemas externas ou físicas, mas que aprisionam pela mentira, pela desinformação; corroendo, assim, a democracia porque acaba leiloando as liberdades por uma atuação que conta com a própria pessoa, que não se vê escravizada, mas que não é capaz de pensar com criticidade para que a gente tenha as liberdades asseguradas”, declara.  

Como enfrentamento à desinformação e garantia da liberdade dos cidadãos, a ministra expõe Os Cinco Vs: o primeiro: volume grande de criação de dados falsos hoje em dia, de tal natureza que o indivíduo não é capaz de estabelecer racionalmente o que vale e o que não vale. O segundo V é sobre a velocidade com que chegam dados oferecidos, muitas vezes “de maneira falsa, mentirosa, inadequada, inoportuna, descontextualizada”, segundo ela. O terceiro V é a variedade, tendo em vista que o volume de dados também impede que o indivíduo racionalize sobre eles. O quarto V é o da viralidade: muito do que vem das plataformas digitais viraliza. Descrevendo sobre a etimologia da palavra, Cármen Lúcia explica que “viral” vem de “vírus”, portanto, traz a ideia de uma doença. Para ela, as investidas incessantes dos dados acometem a saúde da sociedade e prejudicam a garantia da liberdade. E por último, o quinto V é sobre a verossimilhança.  

O ministro Alexandre de Moraes deu continuidade ao painel “Disinformation and the Rule of Law: The Brazil Experience”, falando sobre liberdade de expressão nos dias atuais, não sendo ela sinônimo de liberdade de agressão, inclusive à democracia. Segundo ele, as redes sociais não são neutras, pois o modelo de negócio de faturamento das big techs se dá pelo ataque ou permissão ao ataque, pelo interesse econômico, pelo discurso de ódio, e não pela notícia e exposição de dados – tecendo a grande diferença entre a mídia tradicional e as redes sociais.  

“A mídia tradicional historicamente alcançou sua credibilidade por expor fatos verdadeiros e fazer uma análise responsável independentemente da posição. Isso não serve para o modelo de negócio das big techs, na verdade, pouco importa se o fato é verdadeiro”, afirma.   

O ministro destacou o ecossistema de desinformação “onde aquele que consulta não tem mais condições de saber se a notícia é verdadeira ou falsa, se a notícia veio de um veículo de credibilidade ou de um chamado influencer; se aquele áudio foi ou não tratado pela Inteligência Artificial.”

Alexandre de Moraes finaliza afirmando que a utilização das redes sociais e da Inteligência Artificial podem ser tensionadas para aplicações boas ou ruins, cabendo aos poderes constituintes a regulamentação a partir de dois princípios: liberdade com responsabilidade e tudo aquilo que não vale no mundo real também não vale no mundo virtual, esclarecendo que crimes de ódio, gênero e racismo, por exemplo, não devem ser ignorados. Para o ministro, a regulamentação vai permitir que as redes sociais sejam bem utilizadas.  

“Liberdade de expressão, mas liberdade com responsabilidade. Se as redes sociais se deixarem instrumentalizar ou se auto instrumentalizarem para atacar a democracia, para aumentar o discurso de ódio, elas devem ser responsabilizadas porque se fizessem isso no mundo real, seriam.”  

Fechando o primeiro painel de debate do Global Fact, o Advogado-Geral da União, Jorge Messias, traz à discussão a realidade brasileira, em que 83% dos domicílios têm acesso à internet, e pontua um contraponto de “85% dos brasileiros que afirmam se informar nas redes estão mais vulneráveis à desinformação. E na perspectiva da desinformação é importante que a gente também coloque que nós não estamos tratando a desinformação como um bloco monolítico. Existem várias camadas de desinformação.”  
Messias falou também sobre a politização da desinformação e outras ações que, segundo ele, apresentam riscos à democracia:

“Quando nós tratamos do fenômeno político, da violência política e do discurso de ódio, nós precisamos observar que por trás do fenômeno, o discurso de ódio da violência política, que está muito em voga hoje como uma ação nas redes sociais, nós temos que observar também que ali por trás uma vantagem política conectada a uma tentativa de manipulação democrática.”  

 

Novidades tecnológicas contribuintes à Alfabetização Midiática Informacional (AMI)  

No evento, foi apresentada a plataforma de vídeo DORA, lançada em janeiro de 2025, com o intuito de promover a Alfabetização Midiática e Informacional (AMI) e a cultura da verificação de fatos na Itália através de vídeos educacionais sobre desinformação e novas formas de monetização.  

Na mesma linha de inovação tecnológica e educação, foi apresentado um trabalho com clubes escolares em Dubawa, na Nigéria, a fim de oportunizar o pensamento crítico entre jovens do país.  

Houve ainda a apresentação da FactFlow AI, ferramenta multimodal avançada projetada para análise em tempo real de desinformação, inicialmente aplicada ao Telegram.  

Para o jornalismo ambiental, o público foi apresentado ao Observatório de Mudanças Climáticas TeleguPost e ao BOTO. O Observatório de Mudanças Climáticas TeleguPost, lançado este ano, serve como centro para dados climáticos confiáveis, análises e medidas de combate à desinformação na Índia. O BOTO trata-se de um chatbot do WhatsApp com Inteligência Artificial feita para combater a desinformação ambiental na Amazônia, fornecendo conteúdo verificado, acessível e envolvente. Ele utiliza modelos de linguagem de grande porte (LLMs) para aprimorar a compreensão do público, apoiar a tomada de decisões sustentáveis e empoderar as comunidades contra a desinformação.  

 

O Global Fact na FGV Comunicação

O Global Fact foi grande propulsor para que os checadores pensassem como enfrentar a desinformação sob seus âmbitos profissionais, elencando estratégias de comunicação e tecnologia digital eficazes (no que também diz respeito ao fortalecimento de confiança do público). 

Canalizou as mais diversas temáticas, como a importância da verificação de fatos políticos quando a narrativa é dita por figuras de poder, desafios enfrentados com a polarização, ataques a checadores, sinalização de conteúdos ilegais, preocupação com o futuro de uma sociedade bem informada, o imprescindível papel do jornalismo independente e da verificação de fatos na defesa dos direitos humanos em ambientes digitais hostis, articulação sobre as limitações e oportunidades da própria sociedade ser checadora de fatos, desafios técnicos e éticos no uso de IA para checagens automatizadas e mais. 

Assista à íntegra o mini documentário

As manifestações expressas por integrantes dos quadros da Fundação Getulio Vargas, nas quais constem a sua identificação como tais, em artigos e entrevistas publicados nos meios de comunicação em geral, representam exclusivamente as opiniões dos seus autores e não, necessariamente, a posição institucional da FGV. Portaria FGV Nº19/2018.

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